Carta 24

Algum lugar, 08 de abril de 2020

Querida amizade,

Hoje, escrevo a ti. Sentimento tão profundo e às vezes subestimado. Tu que cresce em nossa infância, desenvolve em nossa adolescência e é entendida quando adulta. Tão essencial quanto o ar, todavia alguns insistem em te deixar de lado, de não apreciar-te e falar que sem ti conseguem viver. Será? És um sentimento opcional?

Creio que não. Mas antes de justificar minha resposta, gostaria que você – amizade – não me abandonasse, não se vá quando mais preciso de ti. A tua volatilidade é assustadora, uma hora estás aqui e na outra já não reside mais. Por que faz isso? Me explique como meu amigo de infância já não é mais lembrado por mim, me diga o porquê da minha amizade de adolescência ter findado quando adulto me tornei…

Penso que se um dia me respondesse, dirias: “Para tudo há o seu tempo, assim como a vida, também há o tempo da morte. Existem momentos em que eu serei essencial, porém passageira. Em tua infância, estou apenas crescendo em ti, aprendendo contigo… Não tenho ainda maturidade para ficar, para me estabelecer, assim como tu também não tens maturidade para dicernir e decidir. Pois bem, em tua infância me verás em todo lugar, se olhares um rosto desconhecido, lá estarei; pois assim como tu, não sei dicernir. Talvez por isso, ao brincar de amarelinha e de pique-pega, verás que estou em todos, tu encontrarás amigos em abundância e jamais estará sozinho.

Em tua adolescência, já estou me desenvolvendo. Eu perco a inocência de criança assim como tu, começo a compreender a maldade que há no mundo. Às vezes uso da maldade para te aproximar de outro, assim como a bondade. Ainda não sou adulta, não tenho todo o conhecimento das coisas. Você me encontrará em teus semelhantes, seja por um estilo musical ou um inimigo em comum. Você está se conhecendo, e eu lhe ajudo nesse processo fazendo com que você encontre outros que te ajudarão a te conhecer e em teu crescimento. Não posso lhe garantir que as amizades nessa fase irão perdurar, ainda não te conheço o bastante para que faças amigos eternos, não sei tudo sobre ti, nem tu mesmos sabe. Então não me peça a eternidade em tua constante mudança. Você está amadurecendo, mas longe ainda de saber aquilo que quer, então porque o outro deve ficar? Porque insiste em algo fixo, sendo que tu és volátil?

Mas um dia fico adulta e me conheço, pois te conheço. Então te apresentarei aqueles que devem ficar, aqueles que também já têm maturidade para enraizar, tu já sabes teus gostos, assim como o outro, então aqui estarei firme. Me peça para ficar, e ficarei. Não me afaste e lhe darei frutos, serei duradoura. Todavia alguém, eu -amizade- tenho diferentes formas, posso amadurecer rápido em alguns desde a infância, de modo que me terás para a vida toda. Mas não questione meus métodos e minhas escolhas, se escolhi para ti, neste momento alguém passageiro, seja feliz por essa amizade passageira. Se na infância te apresentei algo duradouro, se apegue e cultive esse amigo. Seja grato por eu estar ali, e também por eu não estar. Mas saiba que sempre estarei.”

Voltando ao primeiro parágrafo, não. Não acredito que a amizade seja algo opcional. Ela irá apresentar-se em algum momento da vida, sendo passageira ou eterna, em desconhecidos ou familiares, pessoas ou animais. Tu, alguém, conhecerás a amizade assim que ela decidir que é o momento. Não se apegue à solidão, pois todos precisamos de um amigo em algum momento. E se olhares, encontrará a amizade em suas mais diferentes formas e tamanhos.

M.M.

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